segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Desejos e vontades

Levando uma vida dupla, correndo entre a construção da casa e a produção da dissertação, ainda tem muita coisa que abdico para dar conta dessas duas atividades. Coisas estas que serão realizadas assim que uma dessas etapas forem concluídas. O mais interessante disso tudo é que, ao listar os meus desejos, sinto-me igual quando estou perante as promessas de fim de ano, ou às ternas palavras ao moribundo prestes a morrer definitivamente. Afinal, morrer é verbo intransitivo. E intransitivo remete ao sem-trânsito. Quem morre, morre. Assim como as palavras nunca ditas que dissolvem na consciência individual. Assim também como as promessas não cumpridas ou os desejos abortados.

De qualquer forma, vou listá-los. Quero aprender a toca violão. Na verdade, quero mesmo é o piano. Mas isso vai ter que ficar para mais depois. Também quero emagrecer uns bocados aqui. Isso não precisa esperar, mas articular a ansiedade e a escrita sem descontar na comida é mais difícil. No entanto, sigo tentanto. Vou querer também fazer aquela faxina nas gavetas que não abro desde que terminei a graduação. Vou retomar meus estudos de francês, pois sou professor de francês, e ficar sem praticar está enferrujando as palavras que me restam na lembrança. Quero também passar mais tempo com os amigos. Sempre fui assim, até que chegou a vida acadêmica. Vou ainda retomar meu turismo linguístico. Quero ver de novo o esperanto, pegar firme dessa vez e chegar ao nível básico de conversação, com frases do tipo ‘como você está?, bom dia, onde está sua mãe, o que é isso?, etc. Depois do esperanto, ou concomitante, o romeno. Paixão antiga, mesmo sem conhecê-lo. E aí, rever o hebraico também, um pouco de japonês, quem sabe grego e latim? Grego eu nunca vi, e latim é o deleite. Adoro línguas mortas. Lembro-me sempre dos estudos do sânscrito. Mas agora tudo isso está enterrado.

Na contramão dos meus desejos seguem seu curso as necessidades da vida cotidiana. Minha condição de bolsa vai se acabar um dia (já tenho a data). Depois do mestrado, precisarei de um emprego. Como pretendo ser professor universitário, vou tentar engatar já um bom doutorado. E, já sabendo de como pode ser a vida com esses planos, o que vai ficar para trás serão novamente os desejos. A vontade irmã da necessidade é a mais feliz de todas, e eu a conheço. Mas não queria me desfazer das outras partes. Já não danço mais, não faço teatro, nada artístico. Ainda aprendendo a viver sem a arte [feita pelas minhas mãos]. Bom, desejos. Era o que eu tinha para mostrar hoje. Vontades e desejos. Agora, vou voltar ao anseio, às ansiedades, às dúvidas. Ao concreto. Chega de abstração.

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