sexta-feira, 15 de julho de 2011

Feitiço

Seus olhos mostravam o quão tensa a chegada até círculo se revelara durante o trajeto. Não que já tivesse se sentido só algum dia, mas em especial naquela momento, parecia que uma multidão de almas seguravam sua mão. Começou a perceber que a energia de seu corpo passava a emanar para cima, formando uma espiral que subia cada vez mais forte. Não, a espiral não era uma novidade para ela, mas seus olhos perdidos, atentos em um ponto distante no tempo, como quem não consegue conter num silencio um segredo mortal, afoita, aflita, desejosa, temerosa. Como não conseguia emanar sua energia na direção que desejasse? É claro que ela podia. E ela pode, ainda para os que nela acreditam. Dito e feito. O encantamento começou a geminar no peito. Seu corpo, acalentado pelo chão da mata, não resistia a um se quer estímulo terrestre. Tudo de si estava no ar, em pleno movimento. Seus olhos matéreos estavam abertos, porque não importava o que eles podiam ver. Era noite, muito escura por causa da Lua Nova...

Gozava do calor dos trópicos naquele breu e a mata fechou-se sobre ela como se fosse seu próprio manto negro. Sentiu a mão de sua Mãe afagar-lhe a mais sensível e profunda camada áurea. Nem ela mesma sabia que existia em si um espaço tão profundo. Sentiu sua Mãe repentinamente brotar de Lá. Seu Olho Místico viu-se fazer no ar um perfeito círculo de fogo, e dentro dele surgir uma estrela de cinco pontas. Aos poucos, o fogo fez com que a estrela girasse em um eixo central repetidas vezes e a uma velocidade crescente que seu todo desenhou no picadeiro de fogo uma bela esfera, que veio a tornar-se a fruta sagrada, a Maçã. Curiosamente, o fruto partiu-se no ar num preciso corte vertical, como se recebesse e executasse prontamente uma ordem divina. E no seu centro, eis que o círculo de fogo pousou sobre o centro, desenhando com as sementes o pentagrama.
Coma a Maçã, me dizia sem palavra alguma. Coma-me!, ela pedia, sedutora. Era a hora do conjuro. A esfera que voava dela mantinha o espaço claro o bastante para que ela pudesse enxergar minimalisticamente cada espectro do Universo. Mas ela precisava focar em seu desejo. A semente dentro dela era já uma enorme jaqueira, frondosa e generosa, cujos frutos nasciam até tão embaixo, no caule, que algumas jacas cresciam já escoradas no chão. Esse é poder da Grande Mãe, sentiu-a dentro de si ao se dar conta da quantidade de bichos que a árvore poderia alimentar. Era forte assim, para ela. E acolhida na sombra de sua copa, ela emanou desde bastante profundo.... 

Senhora das Horas de Escuridão, Deusa amazona da Lua Nova em sua carruagem de Dragões, Deusa mãe de toda a magia, Deusa das Escolhas, , a Rainha do Submundo, a Alta Voz do Matriarcado. Hécate é seu nome e eu a invoco das minhas profundezas. Desperte em a força e trace meu caminho na direção que eu desejo. Assumo cada passo, reconheço sua Lei Tríplice, mas é tão forte o meu desejo... Traga-a de volta para mim.

Um sopro de vida saiu pela espiral e voou em direção ao seu pedido. Agora, tinha que ter fé e esperar que o fôlego que dera ao sopro fosse o bastante para encontrá-la novamente. Mas os desejos de uma bruxa não tardam nunca, quanto menos falham. Estava feito, lançado. Era agora esperar o tempo de uma vela queimando até o fim. Ela adormeceu.