quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Buraco Negro

Onde é o fim do vácuo? Eu sei que estou caindo nesse buraco negro. Estranhamente, meu corpo não sofre as alterações do ambiente. Ele cai. Por isso, criei para mim uma noção de espaço imaginando que eu estou caindo para baixo, e o que está acima da minha cabeça é o lado de cima, como se fosse a Terra. Mas não existe outro elemento na escuridão com quem eu pudesse comparar as posições. Era importante saber se esse conceito era partilhado. Mas eu estou só. E caindo, ainda por cima. Não tenho a sociedade aqui comigo. Estou só. A solidão é uma invenção da sociedade. Como posso ficar aqui sentindo algo tão social vivendo essa estranha experiência de ficar com o corpo suspenso no ar.

Às vezes, fantasio que é o vento passando por mim e que estou voando. Fico suspenso sem mesmo a sensação do ar fazendo um vento na minha pele descoberta. Não existe nem o ar. E o que estou fazendo aqui? Por que eu? Fico me perguntando... eu me questiono. Nunca respondo. Eu só responderia se eu tivesse para quem. Também pode ser que eu responda para um eu que habita a consciência. Uma parcela de mim. Mas isso tudo é social. O vácuo estava puxando de mim até minha relação de inconsciência, subconsciência. Sempre tentei ser o mais conciente possível. E, no entanto, estou aqui, longamente em queda. De repente, o buraco negro é em cima e eu estou caindo para cima sem nem notar. O homem é uma topeira, às vezes.

Começo a sentir saindo pelos meus poros essa impregnação social. Ali, eu sou apenas um humano. Impotente perante minha condição de queda constante. Sem fim. Um cair que só habitava meu plano das ideias. Era um conceito de queda, mais do que uma queda simplesmente. Eu já caía. Lembro quando vi um feixe de luz correndo pelo meu lado. Olha só que estranho. A noção de tempo é relativa. O tempo aqui parece passar diferente. Não existe a linearidade. Ou ainda, não existe o tempo. Não sei se o tempo passa. Vai ver estamos todos paralisados, limitados por nossas condições.

Minha humanidade está sendo sugada de dentro de mim. Está decaindo. Talvez seja minha alma, se desprendendo de mim. Ou talvez eu já tenha desprendido e estou aqui no universo, sem saber para onde vou. A verdade é que eu precisava mesmo ficar um pouco sozinho. Que ironia é essa, não? Talvez seja um sonho também. Vai ver ainda vou resolver um quebra-cabeça que vai me tirar aqui. Mas esse envolto negro - que até descaracteriza minha forma humana, desprezando meus olhos inúteis - não me dá nenhuma pista. Não há enigma. Eu sei inclusive onde estou. Caindo no buraco negro. Onde estará a chave do mistério? E o próprio mistério? Balela! Isso é tudo fruto social. Ali não existe nada disso. Desprendido da existência humana, perdido no anti-espaço. Também partilho dessa condição. Sou um anti-eu, virei do avesso. Ou de trás para frente. As direções não importam. Nada mais importa.

Minha garganta ata um nó daqueles que serão difíceis de engolir. Os motivos, todos humanos, terrenos. Ali não importa. Minha garganta tranqueada raspou por dentro até que saiu de mim e caiu mais rápido que eu. Engoli, para ver o que sentiria. Senti descendo dentro de uma garganta fora de mim, senti que eu engolia para outra pessoa. E não havia ninguém. Estou enloquecendo, penso.

A loucura é social. Minha loucura desprende-se lentamente de mim e vai caindo na minha frente. Eu não sei qual é a lógica adotada por aqui. Mas meu corpo tem mais matéria que essa consciência. E no entanto é ela quem cai na frente. Ou será que isso não seria físico? Ou seria ainda que o espaço é outro, com outras leis que eu desconheço? As perguntas vão rolando inúteis, inexpressas, nati-mortas. E  a queda continua.

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